quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

CXLIV

.



"se essa rua, se essa rua fosse minha. . . ." fosse não! ela agora é toda minha. todo o asfalto quente percorre os meus poros no passo dado que batem meus pés no seu solo concreto acizentado. sinto o seu cheiro ocre de urina, de guimbas de cigarro, de lixos deixados pro carro da coleta recolher à noite. vizinhas faladeiras, fofoqueiras de plantão no portão. crianças brincando de futebol, soltando pipa, fazendo furdunços que são característicos das crianças. velhos sentados na calçada admirando o nada. carros estacionados e outros carros passando. tudo se movimenta na rua, nada permanece estático. rua, teu nome é caos. tudo pode ocorrer na rua, em qualquer rua. salvante algumas ruas que são até bucólicas e entediantes. todavia as ruas desse bairro são ejaculadoramente movimentadas. por aqui pelas redondezas tudo pode acontecer. MESMO!
de fato. caminhando por uma dessas ruas agitadas. presencio um acontecimento que me deixa indignado. com muita raiva e ânsias de vômito. sim, uma ira, uma ojeriza bem latente me provoca reações descontroladas dentro de mim. eu tenho que pôr toda essa porra dessa coisa irascível pra fora! vejo três polícias enquadrando um garoto negro andando de skate. eles começam a revistá-lo. avisam-no que é uma procedência de rotina. enchem-no de perguntas inquisitórias do tipo: "tá indo praonde? tá vindo de onde? e tal." no passo que eu de cá me explodo de ódio olhando pra esse escabroso, horroroso, escroto fato.
manifesto.
- parem de esculachar o cara, seus porcos, macacos de farda! seus hipócritas de um estado hipócrita! parem de esculacha-lo! - berro, grito, vocifero, esperneio causando um imenso fragor sonoro pela rua - só porque ele é preto. se fosse branquinho.... eu queria ver. eu queria ver. vocês não iriam fazer tudo isso. ah se fosse com um playboyzinho filhinho-da-mamãe-e-do-papai, o tratamento, a abordagem policial seria outra, seus porcos!
pego uma pedra do chão e taco, jogo em direção do carro dos pms como se fora um frisbee - um objeto de  disco feito de plástico com 25 centímetros de diâmetro, usado para entreter cães domésticos. mas o que eu jogo é uma pedra mesmo bem pesada quase um pedregulho que cai certeiro no capô do carro que logo faz um tremendo estrondo. os policiais em seguida me olham.
quando eles deram por conta, eu já estava bem longe. me arranquei de pronto. na verdade, eu pulei, me escondi numa casa abandonada. a única casa abandonada do bairro. uma casa que dizem os mais velhos ser amaldiçoada, assombrada. na qual, afirmam ter ocorrido um suicídio coletivo familiar. será que eu devo MESMO acreditar nessa estória?
é o cúmulo do absurdo pra mim!

Nenhum comentário:

Postar um comentário